Por Pablo Capistrano
Agência Saiba Mais
Um dos lugares comuns da análise política é a de dizer que a esquerda não renova seus quadros, que as pautas ditas progressistas envelheceram e que a militância de esquerda não sabe usar as redes sociais, deixando o terreiro digital virar pasto pra extrema direita alimentar gado. A pergunta que me faço é: será que essa leitura dá realmente conta do cenário?
Sim… eu sei… você vai me dizer que o centrão de Artur Lira elegeu um caminhão de prefeitos e vereadores, que o PSD de Kassab, junto com o MDB, arrastaram o maior número de prefeituras e que Nícolas Ferreira botou um porra louca, fascista de estimação, no segundo turno da eleição em Belo Horizonte. Vai me dizer também que a extrema direita cresce no mundo todo e que o “fenômeno” Pablo Marçal teve um terço dos votos pra prefeito na maior cidade da América Latina, mostrando que uma parte substancial do eleitorado paulistano não consegue identificar um estelionatário quando se depara com um nos debates televisivos.
Sei que você vai me alertar para a velhice de Lula. Vai me lembrar que o velho líder trabalhista é bem maior do que a esquerda, e que seu capital político vai se dissolver após sua saída de cena porque, afinal, depois dele não apareceu mais ninguém. Tá certo que essa é uma forma válida e até bem lúcida em se olhar o cenário, focando, obviamente, no vazio do copo meio cheio.
Eu, particularmente, por mais adepto dos alarmes que o pessimismo da razão nos oferece, insisto em não me render à perspectivas apocalípticas de curto prazo (por mais ululantes que elas sejam).
Penso inclusive que, ao menos aqui em Natal, não estou sozinho nessa tarefa romântica de colocar pra funcionar o otimismo da vontade em um cenário eleitoral tão adverso. Isso porque, ao que parece, muita gente aqui da nossa Taba de Poty já sabe que o passado é uma roupa que não nos serve mais. A surpresa desse segundo turno mostra claramente isso.
Vamos ser sinceros: ninguém apostaria seriamente há dois meses que a disputa pela prefeitura fosse se resolver nesse segundo turno entre Natália Bonavides e Paulinho Freire. Quem imaginaria que Carlos Eduardo Alves, herdeiro do espólio de Dona Wilma (a mulher que construiu a maior liderança política em Natal na virada do milênio) ficaria de fora da disputa.
Obviamente isso se deve em parte, é preciso ser justo, ao excelente marketing de campanha do ex vice prefeito de Micarla de Souza. Com engenho e arte, os marqueteiros de Paulinho conseguiram fazer com que parte do eleitorado pensasse que o candidato do atual prefeito Álvaro Dias era, na verdade, representante da oposição. Cheguei a comentar isso com Ana, minha esposa, enquanto assistia o horário eleitoral na cozinha lá de casa, na hora do almoço.
___ Paulinho tá falando como se fosse candidato de oposição. – eu disse, notadamente surpreendido, com a ousada estratégia de marketing da campanha do candidato do cordão azul.
A transferência da rejeição do atual prefeito para o ex prefeito Carlos Eduardo Alves foi a cereja no bolo da sangria de votos que atingiu a campanha do agora chamado “cabeção”.
O grande problema é que, com Carlos Eduardo fora do jogo, Paulinho vai ter de esconder Álvaro Dias em alguma loca da serra de São Bernardo, lá em Caicó, pra não deixar que a estagnação e o marasmo administrativo da atual gestão prejudique sua campanha.
Até porque, na boa, temos de admitir que é Natália Bonavides quem traz a brisa do novo pra arejar a política potiguar.
Paulinho Freire, macaco velho da política institucional, vinculado até o pescoço com o sistema político que governa Natal há mais de uma década, num contínuo administrativo que remonta a “inesquecível” gestão Micarla de Souza; vai ter de botar o seu marketing pra rebolar muito e esconder essa mesmice tediosa que toma conta da administração de uma cidade que um dia parecia estar cheia de futuro.
A sensação de que Natal parou no tempo e está sendo “ultrapassada” por outras cidades nordestinas como João Pessoa, por exemplo, é uma ferida mortal no orgulho potiguar. A impressão de descuido e abandono que a cidade vive, com ruas intransitáveis, transporte urbano cada vez mais precário, trânsito caótico e quarteirões pontuados por casas fechadas com placas de “vende-se”, contrasta, nesse presente distópico, com a Natal que prometia, nos primeiros anos do século, um futuro utópico de civilidade urbana de melhor qualidade de vida. Só quem ama o passado é que não vê.
Há então uma Natal que anseia em se tornar a cidade que um dia sonhou Manoel Dantas, na sua célebre conferência de 1909. Há uma Natal que não se rende ao pânico moral que a extrema direita lança para deixar sua militância ouriçada. Há, amigo velho, uma Natal que se recusa a fazer tudo aquilo que o mestre mandar e que pensa uma gestão que não se repita seguindo sempre o modelo do velho, do antigo, daquilo que não só não funciona como que é, de fato, a causa da crise em que caímos e que se arrasta há tanto tempo.
Você pode até pensar, amigo velho, que eu estou por fora ou que então estou inventando, mas sei que há uma Natal que sabe bem que precisamos todos rejuvenescer, porque no presente a mente e o corpo é diferente e o que há algum tempo era jovem e novo, hoje é antigo.
Talvez você não sente e nem vê, mas eu não posso deixar de dizer, amigo velho, que uma nova mudança em breve vai acontecer… e digo isso não porque eu seja iniciado na arte das previsões eleitorais como são os meus colegas da ciência política ou porque seja instruído nos saberes milenares do tabuleiro de Ifá ou da leitura do livro de Toth, escrito nas cartas do Tarot.
Penso isso porque, independente do resultado eleitoral desse segundo turno, sei que enquanto houver história a ser escrita e um futuro a ser sonhado, o novo sempre vem.